Após o golpe de estado bolchevique na Rússia, este é o primeiro livro de referência sobre uma tragédia de dimensão planetária, com numerosos testemunhos, mapas, fotografias, e mapas das deportações.
Já se escreveu que “a história é a ciência da infelicidade dos homens”; a própria história parece confirmar séculos de violência entre todos os povos e estados. As principais potências europeias estiveram implicadas no tráfico de negros; a República francesa praticou uma colonização que, apesar de algumas contribuições, foi marcada por numerosos episódios repugnantes, e isso até o seu término. Os Estados Unidos permanecem impregnados de uma certa cultura da violência que se enraíza em dois dos mais terríveis crimes: a escravidão dos negros e o extermínio dos índios.
Um olhar retrospectivo impõe uma conclusão incômoda: apesar da vinda do Cristo, da divulgação em massa de suas lições, da aceitação pela maioria dos povos, principalmente ocidentais, o comportamento maléfico continua predominando sobre o potencial de fazermos o bem. Observamos uma escalada de violência nas últimas décadas, incompatíveis com o progresso tecnológico que alcançamos, se ao lado desse houvesse tido a evolução moral cristã. Houve catástrofes humanas como as duas guerras mundiais, o nazismo, sem falar das tragédias mais circunscritas, como as da Arménia, Biafra, Ruanda e outros países.
Com efeito, o Império Otomano entregou-se ao genocídio dos arménios, e a Alemanha ao dos judeus e dos ciganos. A Itália de Mussolini massacrou os etíopes. Os tchecos têm dificuldades em admitir que seu comportamento em relação aos alemães dos Sudetos, em 1945-1946, não esteve acima de qualquer suspeita. A própria Suíça é hoje alcançada por seu passado como o país que gerenciava o ouro roubado pelos nazistas dos judeus exterminados, apesar desse comportamento não ser em nenhuma medida tão atroz quanto o do genocídio.
O comunismo insere-se nessa faixa de tempo histórico transbordante de tragédias, chegando mesmo a constituir um de seus momentos mais intensos e mais significativos. O comunismo, um dos fenómenos mais importantes do século XX - que começa em 1914 e termina em Moscou em 1991 -, encontra-se no centro desse quadro. Um comunismo que preexistia ao fascismo e ao nazismo, e que sobreviveu a eles, atingindo os quatro grandes continentes.
O que pode ser designado precisamente com a denominação “comunismo”? Devemos, desde já, introduzir uma distinção entre a doutrina e a prática. Como filosofia política, o comunismo existe há séculos, e quem sabe, há milénios. Pois não foi Platão quem, em “A República”, fundou a ideia de uma cidade ideal na qual os homens não seriam corrompidos pelo dinheiro e pelo poder, na qual a sabedoria, a razão e a justiça comandariam? Não foi um pensador e estadista tão eminente quanto Sir Thomas More, chanceler da Inglaterra em 1530, autor da famosa Utopia e morto sob o machado do carrasco de Henrique VIII, um outro precursor da ideia dessa cidade ideal?
O método utópico parece perfeitamente legítimo como instrumento crítico da sociedade. Ele participa do debate das ideias - oxigénio de nossas democracias. Entretanto, o comunismo que é abordado nesse livro (O Livro Negro do Comunismo), não se situa no céu das ideias. É um comunismo bem real, que existiu numa determinada época, em determinados países, encarnado por líderes célebres - Lenin, Stalin, Mao, Ho Chi Minh, Castro, entre outros.
Qualquer que seja o grau de envolvimento das doutrinas utópicas anteriores a 1917 (Revolução Russa) na prática do comunismo real, foi este quem pôs em prática uma repressão metódica, chegando a instituir, em momentos de grande paroxismo, o terror como modo de governo. Isso faz com que a ideologia seja inocente?
Os espíritos ressentidos ou escolásticos sempre poderão sustentar que o comunismo real não tem nada a ver com o comunismo ideal, com as utopias. Evidentemente, seria absurdo imputar a teorias elaboradas antes Cristo, com os eventos que surgiram no decorrer do século XX. Entretanto, como escreve Ignazio Silone (escritor e político italiano), “na verdade, as revoluções são como as árvores, elas são reconhecidas através de seus frutos”.